Fiquei feliz ao ver a notícia que a Universidade Federal do Acre conseguira alcançar um programa de doutorado (ver ou aqui).
Entretanto, ao iniciar a leitura da reportagem, fiquei curioso por entender como que a CAPES recomendaria um curso de doutorado para uma universidade que nem possui mestrado na área.
Mas fui atrás das informações para ver o que realmente estaria ocorrendo.
Primeiro, quando a área de Ciências Florestais.
Nesta área, a UFAC submeteu recentemente as seguintes propostas à CAPES:
2011: Mestrado Acadêmico em "Recursos Florestais na Amazônia". Neste ano, a síntese do parecer foi que a proposta não apresentou grupo de professores com maturidade científica suficiente. Portanto, o programa não foi recomendado. Conceito da proposta 2.
2012: Mestrado Acadêmico em "Ciência Florestal na Amazônia". Novamente, o parecer da CAPES foi pela não recomendação do mestrado, com a seguinte justificativa: corpo docente permanente com pouca maturidade científica, docentes sem nenhuma
experiência em orientação de alunos, produtividade científica abaixo do exigido e não possuem nenhuma publicação em artigos internacionais. Conceito para o mestrado acadêmico: 2 (recebeu conceito 1 na Comissão de Área)
Bem. Por dois anos seguidos, os conceitos obtidos pela Engenharia Florestal foi 2, sendo que o mínimo necessário para um mestrado acadêmico é conceito 3 e para um doutorado é conceito 4.
Mas não só na área de ciências florestais a UFAC tem buscado um doutorado.
Em 2011, foi apresentada uma proposta de doutorado e mestrado em Ciência, Inovação e Tecnologia para a Amazônia. A proposta recebeu conceito 3, o que permitiu a aprovação do mestrado acadêmico, mas não do curso de doutorado.
Agora em 2012, foram também apresentadas duas propostas de doutorado para a UFAC, uma do programa de Produção Vegetal e outra do programa de Desenvolvimento Regional (ambos os cursos já com o mestrado em funcionamento deste 2006).
No programa de Produção Vegetal (Agronomia), foi atribuído conceito 2 à proposta, cuja síntese do parecer foi que a proposta apresentou disciplinas com ementas desatualizadas, falta de equilíbrio entre o número de docentes e as linhas de pesquisa, pouca maturidade científica do corpo docente, que se expressa pela baixa produção científica.
A proposta do programa de Desenvolvimento Regional apresentada a CAPES também foi rejeitada, pelas razões a) a descrição da área de concentração e das linhas de pesquisa é insuficiente, não evidenciando satisfatoriamente o caráter interdisciplinar; b) a grade curricular apresenta certo grau de rigidez, tendo em vista o pequeno número de disciplinas optativas; c) o número de professores é inferior ao recomendado pela área interdisciplinar; d) o índice de produtividade (0,23) situa-se abaixo do exigido até mesmo para um curso de mestrado.
Se formos avaliar a situação da pós-graduação da UFAC, ela realmente é desastrosa. O número de propostas enviadas demonstram claramente que há um grupo de professores que estão trabalhando pelo prol da Universidade, mas a instituição tem demonstrado sua incapacidade de manter-se com este título de instituição universitária, correndo o risco até mesmo de perder esta condição a partir de 2013.
Mas do que trata-se então a notícia sobre o doutorado da UFAC?
Para responder, vou desconsiderar que os colegas Evandro Ferreira e Ary Vieira de Paiva tenham se prestado a fazer qualquer propaganda enganosa sobre a situação da pós-graduação na Universidade Federal do Acre ou sobre a qualidade das pesquisas que estamos conduzindo.
Também vou desconsiderar que o senador Jorge Viana seja tão despreparado que não saiba exatamente como anda a situação da UFAC e, principalmente, na área de Ciências Florestais que ele tanto tem procurado promover.
É preciso compreender melhor o que trata-se este programa interinstitucional, mas antevejo duas possibilidades apenas:
- um doutorado na modalidade DINTER, em que a Universidade que recebe o doutorado contrata uma outra instituição melhor qualificada para ajudar na formação de seus recursos humanos ou,
- um programa em rede, em que a CAPES está credenciando a instituição líder, no caso o Instituto de Pesquisas da Amazônia, que poderá emitir os diplomas, e a UFAC, estaria participando apenas como instituição de apoio, mas onde a estrutura acadêmica e científica da instituição líder define o escopo do programa.
O que em posso afirmar com bastante certeza, é que a CAPES não aprovou nenhum programa de pós-graduação em nível de doutorado para a UFAC na área de Ciências Florestais ou em nenhuma outra área.
Mas o que mais me preocupa é a falta de entendimento do senador sobre o processo. A UFAC não está bem, mas não será por meio de reuniões no gabinete do senador ou do governador, como ele mesmo fez quando era governador, que será possível proporcionar a Universidade a qualidade mínima para que possa ter programas de pós-graduação pelo menos regulares.
As ações que este governo adota para apoio a pesquisa são uma fantasia. Um exemplo, foi a criação do Fundação de Apoio a Pesquisa para o estado do Acre, que foi criada como um trem da alegria, com a criação de dezenas de cargos desnecessários, sem uma discussão concreta com os professores da UFAC que realmente fazem pesquisa e estão trabalhando a duras penas nos cursos de pós-graduação da instituição, muitas vezes com sobrecarga de horário.
Ou seja, recursos que deveriam ir para o pagamento de bolsas de iniciação científica, de bolsas de mestrado ou custeio de pesquisa, serão aplicados no pagamento dos cargos comissionados ou na contratação de companheiros para trabalhar na fundação.
Enquanto isto, faltam recursos para a pesquisa.
E não nos enganemos. Daqui há dois anos, alguém deste governo voltará a anunciar que a UFAC agora tem um doutorado próprio. E novamente, será outra coisa, porque os índices que a CAPES exigem para a aprovação de cursos de doutorado somente são conquistados com anos e anos de pesquisa e produção científica.
Paulo Wadt
Fico indignado ao imaginar que a notícia possa ter sido feita apenas para se ganhar as eleições para a Prefeitura de Rio Branco.