Lembro da primeira vez que cheguei a Rio Branco, foi em 1984. Depois de viajar o dia inteiro vindo de Porto Velho, com gosto de tijolo na boca. Trazia comigo cinco fardos com mercadorias que pretendia vender. Saindo da rodoviária, atravessei a rua e entrei no Hotel Rodoviária. Um local simples, mas, as pessoas me acolheram com muita simpatia. O Epílogo era o gerente e também taxista e sua esposa "Fia" e os pais dela cuidavam dos hóspedes. Foram os primeiros amigos que fiz por aqui e continuamos amigos até hoje. As confecções que eu tinha trazido não duraram muito, todo mundo queria comprar... A Ademilde (da Saudosa Maloca) era sacoleira e foi minha primeira cliente... Outras pessoas souberam e me procuraram, fiquei uma semana em Rio Branco e fui embora, sem os fardos de mercadoria e com o dinheiro no bolso. Fui em direção aos meus fornecedores comprar mais mercadorias para voltar. Até 1991, vinha constantemente ao Acre e minha admiração por este povo só foi crescendo. Em 1991, mudei definitivamente para cá e não me arrependo!
Naquele tempo, o Acre era um lugar diferente. Pouco desenvolvido, porém muito tranquilo, não havia violência, você podia ficar na frente de casa conversando com o vizinho ou deixar o carro com a janela aberta na rua ou na garagem da sua casa. Se alguém consumia drogas a gente nem ficava sabendo, pois, era muito raro.
O povo acreano gosta e sempre gostou de se divertir muito. Havia diversos lugares para isso, o mais famoso deles era o Barracão do Quinze, que não sei como deixaram acabar. Ali se reuniam pessoas de todas as classes sociais. Mas, o lugar onde mais gostava de ir era na terça-feira do Kaxinauá. Era um lugar onde se reunia a fina flor da cultura de nossa cidade. Comandados pelo saudoso Hugo Conde, com seu Grupo da Madrugada, que fazia ali deliciosas serestas, Crescêncio, Assis Dantas, Fernando Galo, Casquinha, eu e outros, faziamos parte daquela trupe. Declamava-se poesia, se ouvia MPB com Serjão ao violão, Nilda Dantas, Elias Junior, Beco, Tião Natureza e muitas outras pessoas, tudo isso regado a muita cerveja, quitutes e muita, mas, muita paquera. Na quinta-feira a gente ia para o Chalé Bar, que ainda era na Hugo Carneiro, na casa do Zezinho, a madrugada por ali costumava demorar pra acabar. Claro que a gente não pode deixar de falar do Casarão, onde Elói de Castro e sua turma faziam a festa.
Sexta e sábado, havia outros lugares... O Rubens (da Ademilde) tocava um local ali na invernada chamado Luar de Prata, mas, o point da sexta-feira era mesmo o Tio Bahia, na Vila Acre. Sábado era noite de Barracão do Quinze, Nosso Clube e acho que estava começando o 14Bis. Havia também festas em alguns clubes e a noite era muito animada. Na saída desses lugares, a gente ainda podia ficar nas esquinas, batendo um último papo ou tomando uma última cerveja e é claro, depois a gente ia para o Mercado do Bosque. Atrás do CERB tinha um barzinho num hotel, que me foge o nome agora, onde a presença era certa nas segundas-feiras, tinha MPB com Ademar Galvão, foi lá que conheci meu amigo Guerra, que estava iniciando aqui a empresa Barriga Verde Mat. de Construção.
Se eu gostava de festa? Claro eu era o rei da noite! Me chamavam pra cantar em todos esses lugares... Bons tempos aqueles!
Por que estou falando dessas coisas? Ora, porque isso era importante! Era assim que se vivia no Acre antigamente. Paz, alegria, tranquilidade, cada um cuidando da sua vida. Quem era rico, era rico, quem era pobre, era pobre, só não havia desgraçados e miseráveis, e a gente vivia feliz.
Aí começaram as "aberturas", instalou-se a Democracia no país e o Acre não poderia ficar para trás. Na década de 90 chegaram por aqui uns alienados e megalômanos. Não estavam satisfeitos com o Acre como ele era. O Acre tinha que ser "grande", diziam eles. Na realidade, o acreano comum, aquele que pouco ou nunca tinha saído daqui, "não queria ser grande", queria ser "apenas acreano", do jeitinho que sempre fora! Trabalhar no governo, na prefeitura, em algum orgão federal, receber seu salário, conversar fiado com os amigos, ir pra "colonha" comer galinha caipira, tatu e paca, beber uma cachaça e fazer amor. Era assim a nossa vida por aqui.
Mas, o Acre começou a crescer... Cresceu a corrupção. Cresceu o êxodo rural, cresceu a violência, cresceu o tráfico de drogas, a prostituição, o roubo, o furto, o assassinato, o crime em geral. Acompanhando tudo isso, cresceu o desemprego, pois, a população urbana aumentou enquanto a rural diminuiu à cada dia, e não há emprego para todo mundo. Criou-se em torno da capital e das cidades do interior, cinturões de pobreza, de miséria, de desgraça e, agora a criminalidade é incontrolável.
E o Acre como Estado cresceu? Não, o Acre ainda vive basicamente do Governo, do comércio, de meia dúzia de pseudo-indústrias e de muita mentira. Imaginem apresentar na Rio +20, um projeto "de" projeto da construção de um bairro em Rio Branco, como "Exemplo de cidade sustentável para o Mundo". Mas, os loucos que chegaram aqui com idéias de grandeza, esses enriqueceram, bem como uma trupe de gente que os tem ajudado nestes anos todos. O Acre? Está endividado até o pescoço como instituição.
O nome deles? Os políticos ora! Foram eles que estragaram o que era uma coisa boa!
Disseram que iam desenvolver o Acre e não fizeram. Disseram que o Acre seria sustentável e os únicos "sustentados" são eles e seus apaniguados. Disseram que iam industrializar o Acre e até hoje não o fizeram.
Esses chegaram por aqui dizendo que os que estavam no poder eram catrepeiros, que não gostavam do Acre, que pilhavam o erário, que eles eram os "salvadores da pátria" e iriam "por fim na pouca vergonha", não fizeram nada disso... 20 anos depois, todo dia espoca escândalo pra lá e pra cá e o povo está insatisfeito.
O Acre tá mais bonito? Com certeza está, não poderia ser de outra maneira, alguma coisa eles tinham que fazer pra justificar mais de 2 bilhões de empréstimos e todo o dinheiro mandado pelo Governo Federal, que entre Fernando Henrique e Lula não foi pouco. Mas, boniteza não põe a mesa...
O Acre já foi melhor... O Acre era mais humano... As pessoas se conheciam... As pessoas se respeitavam.
Acreucho Nascimento